Muitos brasileiros conhecem a famosa Pasárgada de Manuel Bandeira. Aprendemos o poema na escola e carregamos conosco a ideia de fugir para a utópica cidade, onde a existência é uma aventura e somos amigos do rei. Cada um construiu sua própria Pasárgada na imaginação, mas quase ninguém sabe que ela existe de verdade e fica no Irã.
Pasárgada significa “Campo dos Persas” e foi a capital do Império Persa, um dos maiores que o mundo já viu. Ciro, o Grande, rei que deu início ao império, a construiu em 500 AC. Infelizmente, apenas ruínas sobraram da suntuosa capital.
Quem visita o Patrimônio Mundial da Unesco hoje em dia, perto da cidade de Shiraz, verá a enorme e relativamente bem conservada tumba de Ciro, e as ruínas de dois palácios, uma fortaleza e um jardim. Os jardins persas eram tão bonitos que são mencionados em diversos livros da antiguidade e até hoje influenciam projetos de arquitetura no mundo. Eles eram chamados “Paradisia”, e é daí que vem a palavra “paraíso”.
Ciro é considerado um dos mais inteligentes comandantes da história e suas habilidades políticas e militares são ainda elogiadas e estudadas – foi ele quem criou a noção de federalismo. O rei persa, no entanto, também é reconhecido por seus ideais humanitários, e tem gente que diz, inclusive, que ele escreveu o primeiro capítulo dos direitos humanos no famoso Cilindro de Ciro. Além de ser a primeira pessoa a abolir a escravidão, o rei respeitava as minorias religiosas e culturais dos povos sob seu comando e era chamado por muitos de “Grande Pai”.
Manuel Bandeira escutou o nome Pasárgada pela primeira vez quando tinha 16 anos e leu um texto de um autor grego. O nome do Campo dos Persas remeteu a coisas boas, a uma terra de tranquilidades e belezas. Anos depois, em seu apartamento, em um momento de tristeza e angústia, teve a ideia “vou-me embora pra Pasárgada” e assim criou o poema que até hoje permeia o imaginário de grande parte da população brasileira.
A Pasárgada de Manuel Bandeira não tem muita relação com a de Ciro, o Grande, mas confessamos que foi emocionante poder conhecer a utópica cidade que tantas vezes imaginamos quando criança. Fomos embora pra Pasárgada e voltamos… Hoje, nem a fantasia do autor ou a grande capital persa nos convence. Nossa Pasárgada tem sido o mundo e é pra lá que vamos, vivendo de aventuras e sem querer ser amigo de rei algum.
Como chegar
Vá a livraria mais próxima e compre o livro de poesias do… hum… não. A outra Pasárgada!
Pasárgada fica a 130km de Shiraz, uma das maiores cidades do Irã. Shiraz tem aeroporto internacional, mas também é facilmente acessível por terra. Os ônibus no Irã são extremamente confortáveis e baratos.
Em Shiraz, há várias opções de agências de viagens que cobram mais ou menos $50 por pessoa para um dia inteiro de passeio, que incluem visitas a Pasárgada, Persépolis (a mais importante capital do Império Persa) e Necrópolis (a Cidade dos Mortos iraniana; ali estão as tumbas de quatro reis persas, entre eles a de Dario, o Grande). O valor inclui transporte, almoço, guia e ticket.
Para os que estão viajando com menor orçamento, esse mesmo percurso pode ser feito por conta própria, pegando um dos táxis compartilhados que saem da rodoviária. O preço de um carro por mais ou menos 6h, te levando a esses mesmos destinos, sai por $40 no total. Entrada para os monumentos não estão inclusas, mas custam entre $1,00 a $5,00 cada.
A Pasárgada de Manuel Bandeira
Vou-me embora pra Pasárgada
Manuel Bandeira
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Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
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Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
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Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
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E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
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E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
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Vou-me embora pra Pasárgada
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Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
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Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
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E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
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— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
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Vou-me embora pra Pasárgada.